Para o delegado titular da 34ª DP (Bangu), Fábio Luiz Souza, responsável pelo caso da moça que levou o cadáver do tio a uma agência bancária na tentativa de realizar um empréstimo, não há dúvidas de que o idoso já estava morto àquela altura e que a sobrinha estava ciente disso.
Érika Souza Vieira Nunes, de 42 anos, que já era investigada por vilipêndio de cadáver e tentativa de furto mediante fraude, passou a ser acusada também de homicídio culposo — quando não há intenção de matar. Ela está em prisão preventiva em Bangu, na Zona Oeste.
Segundo Souza, “não há dúvidas de que Érika sabia da morte de Paulo, mas, como era a última chance de retirar o dinheiro do empréstimo, entrou com o cadáver no banco, simulou por vários minutos que ele estava vivo, chegando a fingir dar água. Ela pegou a caneta e segurou com sua mão junto a mão do cadáver de Paulo, contudo, como os funcionários do banco não dispersaram a atenção, não pôde fazer a assinatura””
Em despacho feito anteriormente, o delegado havia apontado uma “gritante omissão de socorro” por parte da sobrinha: “Considerando que no dia 16/4/2024, certamente percebendo que Paulo estava em situação gritante de perigo de vida, o que pode ser vislumbrado pelas declarações de todas as testemunhas que tiveram contato com a vítima, ao invés de ir novamente ao hospital ela se dirigiu ao shopping, configurando uma gritante omissão de socorro. Determino: proceda-se a novo registro de ocorrência para apurar o delito de homicídio culposo”.
A primeira fase do inquérito, referente à prisão em flagrante, terminou nesta terça-feira (30). A segunda fase vai definir se Érika será formalmente indiciada por homicídio culposo. De acordo com a Polícia Civil, a mulher, enquanto cuidadora do tio, “ao ver que ele não estava bem, deveria ter levado o tio ao hospital, e não a uma agência bancária”.
Relembre o caso “Tio Paulo”
Em 16 de abril, Érika levou o corpo do idoso Paulo Roberto Braga, de 68 anos, a uma agência bancária em Bangu, na Zona Oeste do Rio, para tentar realizar um empréstimo de R$ 17 mil, que, segundo ela, seria usado para comprar uma TV e reformar a casa.
Uma funcionária da agência bancária afirmou que havia achado o homem muito debilitado. Na hora de o idoso assinar, ela percebeu que ele não respondia e estava com aspecto pálido e sem apresentar sinais vitais. Nesse momento, Érika coloca uma caneta na mão do homem e levando sua mão à mesa, mas ela não firma e cai.
No banco, ela insistia todo o tempo para o idoso assinar o documento, pegando na mão dele e tentando fazer com que escrevesse. No vídeo, por diversas vezes, ela segura a cabeça de Paulo Roberto, que cai para trás, para frente ou para os lados, sem um momento de firmeza sequer. Érika acabou sendo presa em flagrante. Após a audiência de custódia, a prisão em flagrante foi convertida em preventiva. Na determinação, a juíza Rachel Assad da Cunha definiu a ação como “repugnante e macabra”.
Em depoimento, um mototaxista que foi chamado por volta das 12h20 para ajudar a colocar Paulo em um carro de aplicativo disse que o idoso respirava e “tinha força nas mãos”, tendo segurado a porta do veículo. O motorista de aplicativo que levou os dois até o Shopping Real Bangu afirmou que o idoso segurou a maçaneta do carro ao ser retirado do veículo. O estabelecimento fica próximo ao banco, onde a morte dele foi constatada.
Porém, o laudo do Instituto Médico Legal não conseguiu determinar a hora exata da morte: a previsão é que tenha acontecido entre entre 11h30 de terça-feira, dia em que foi na agência, e 1h de quarta-feira. Paulo Roberto morreu por conta de broncoaspiração do conteúdo estomacal (provocada pelo engasgo com algum alimento) e falência cardíaca.
A conclusão do perito que assinou o documento é de que “não há elementos seguros para afirmar, do ponto de vista técnico e científico, se o Sr. Paulo Roberto Braga faleceu no trajeto ou interior da agência bancária, ou que foi levado já cadáver à agência bancária”. O laudo confirmou também a debilidade do homem, que estava “previamente doente, com necessidades de cuidados especiais”. Ele havia ficado internado durante uma semana na UPA de Bangu em decorrência de uma pneumonia, precisando da ajuda de aparelhos para respirar.
A morte do idoso só veio a ser atestada às 15h20 de 16 de abril, pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) que foi chamado pelos funcionários do banco que perceberam que o idoso não reagia às tentativas de Érika, que queria fazê-lo assinar a liberação do empréstimo. Paulo Roberto foi enterrado quatro dias após o episódio do banco, em um sepultamento social, gratuito, conforme solicitado pela família, que alegou falta de condição financeira de arcar com a despesa.