Neste ano de disputadíssimas eleições nos municípios fluminenses, pensar nos anos em que a “rivalidade” entre os dois pés-sujos mais tradicionais do centro de Petrópolis começou é curioso: o Bar Glória foi inaugurado em 1964, ano do golpe, e sua sardinha frita empanada no fubá servida desde os anos 80 praticamente no meio da rua é (ou deveria ser…) um patrimônio imaterial da cidade. Já o Bar Colon abriu no ano que não terminou, 1968, AI-5, e tem no seu generoso e democrático balcão uma estufa com torresmos imensos e sorridentes, nacos de copa lombo molhados e espetaculares bolinhos de carne que deixam os tais croquetes do Alemão lá da estrada absolutamente… Im pantoffel.*
Depois de tantas décadas, hoje ambos os bares são símbolos raros e renitentes de um centro de Petrópolis que não volta mais e se apaga lentamente. Mas jamais por causa deles! Em seus balcões, a velha boemia local segue firme. Ainda alimenta clientes fieis, fascina nostálgicos boêmios, diverte turistas famintos e, mais recentemente, influencia os influencers… Mas que bom que no Glória e no Colon as grandes estrelas ainda são a história, a comida, as conversas. E até mesmo um certo silêncio reverente, enquanto que nas TVs ignora-se até a Eurocopa para ouvir-se clipes de Almir Sater, Geraldo Azevedo, Zé Ramalho…. Genuína delícia serrana.
No Colon, o clima é quase de associação atlética: tirando os turistas que nos finais de semana descobrem e se encantam com o bar, o salão quase sempre é tomado mesmo por moradores. Gente que tira onda com Seu Jiló, o funcionário mais antigo, que pede música de alguma banda bem obscura pra assistir no telão, que adora jogar conversa fora e sempre tem uma história legal pra compartilhar. No balcão imenso, a estufa é uma Pedra da Gávea: impossível não notar os grandes arcos de torresmo empilhados, só aguardando a ordem para serem picados e enviados ao freguês.
Igualmente chamativas são as peças de copa lombo, fumegantes, tão famosas por lá que não costumam esperar mais de dez minutos para serem escolhidas por um felizardo qualquer. Coisa não muito diferente acontece com os bolinhos de carne: espetaculares no sabor, no formato de disco e na consistência honesta, são realmente especiais. Lá, como em outras cidades do interior do Rio, são chamados de “tapa na cara”. Dizem que é porque o processo de preparo exige fortes batidas na massa de patinho moído, o que geraria o som característico de uma mão estalando no rosto de outrém… Não sei se é verdade, mas prometo investigar.
Já o outro candidato nessa eleição eterna e sem vencedores para escolher o boteco mais raiz de Petrópolis tem uma rotina mais discreta, mas igualmente interessante. No pequenino Bar Glória, que funciona há exatos 60 anos na Rua General Osório, no coração do centro da cidade, mal há espaço para sentar. A onda, aqui, é pedir a sardinha frita histórica – empanada no fubá igualzinho como se estivéssemos no Beco das Sardinhas da Rua do Acre, ou melhor – e levar a apetitosa iguaria para ser devorada, ao lado de uma cerveja gelada, meio limão galego e muito guardanapo, num dos bancos da praça logo em frente. Sem cerimônias, e longe dos olhares julgadores ou gulososos dos companheiros de balcão. Na volta, depois de devolver o pratinho e jogar o papel no lixo, a hora é de pedir outra cerveja, uma cachaça ou até mesmo o torresmo, que lá também é muito bom. Tudo preparado sob a batuta da família do Maicon e seu pai Acácio, que administra o bar desde 1985. Quase 40 anos de balcão…
Enfim, caro leitor: nesse ano de eleições municipais em que as composições locais formam um jogo de xadrez sem tabuleiro e cheio de saliva na disputa pelos poderes locais, eu não faço a mínima ideia do que acontece na corrida rumo ao Palácio Sérgio Fadel. Mas se o distindo leitor quiser saber onde comer bem, barato, farto, sem frescura e com história por lá, o colunista aqui pode ajudar. Lembrando que nesse fim de semana ainda tem o último dia da BauernFest, a grande festa da cerveja de Petrópolis, que acontece a menos de 50 metros do Colon!
Bar Colon:
Rua 7 de abril, 398, Centro, Petrópolis
☎ (24) 2247-0734
@barcolon.petro
Bar Glória:
Rua General Osório, 128, Centro, Petrópolis
☎ (24) 2237-2538
📱 (24) 98112-5155
@bargloria128
(*): Im pantoffel: “No chinelo” em alemão, segundo o Google.
(Mas não creio que a expressão por lá funcione da mesma forma que aqui. Não recomendo reproduzir…).