Mais de 20 anos atrás, quando num impulso movido a álcool comprou com cheque cruzado e fundos duvidosos o botequim em que bebia todo dia com os amigos, o então jovem cachambiense vascaíno Marcelo Novaes achou que estava fazendo apenas mais uma das suas traquinagens: ter uma birosca para chamar de sua e poder beber em paz com os amigos, sem hora pra fechar.
Mal sabia ele que a birosca se tornaria um dos bares mais famosos e amados da gastronomia popular carioca. Menos ainda que, entre o batalhão de clientes apaixonados pelo bar, estariam alguns (ou melhor, vários…) dos políticos mais conhecidos do Rio de Janeiro. A ponto do assessor de um deles, veterano versado nos primóridos da política, tirar da cachola a comparação perfeita com o clássico e hoje extinto Cosmopolita, da Lapa, local onde Osvaldo Aranha inventou o seu filé e que nos anos 30 e 40 atraía tantos senadores da Velha República, então alocados no vizinho Palácio Monroe, que ganhou o apelido de Senadinho: “Juarez, o Cachambeer é o Senadinho do subúrbio!”.
Uma chancela que, tenho certeza, o próprio prefeito do Rio, ele também um fiel frequentador do bar, assinaria embaixo. Afinal, a cúpula política fluminense já se acostumou nos últimos anos a ir desanuviar a cabeça nas mesas deliciosamente impregnadas de gordura de costela no bafo da “birosca” do Marcelo, hoje um bar estruturado com capacidade para quase 150 pessoas sentadas. Enfileirando chope gelado atrás de chope gelado (“se estiver quente, a gente fecha a birosca e vai procurar outro bar pra beber”, costuma dizer o dono há anos, sem nunca ter precisado cumprir a promessa), já foram vistos por ali gente tão diferente quanto Marcelo Freixo, ACM Neto, Tarcísio Motta, José Beltrame, Eduardo Leite e Arthur Lira.
Todo esse prestígio de um singelo bar suburbano junto a poderosos expoentes de diferentes matizes da política acontece por três razões. A primeira, mais evidente, é que o bar é bom pra cacete mesmo (com o perdão do meu francês…). Comida farta, saborosa, barata e sem frescura, num ambiente que funciona quase como uma aula de carioquice genuína. A segunda é o prefeito Eduardo Paes. Foi ele quem “descobriu” o bar, ainda no seu primeiro mandato, depois que a casa começou a ser elogiada publicamente por um ou outro jornalista aficcionado em botequim. Paes hoje é um cliente tão assíduo que organiza, ele próprio, encontros e comemorações com amigos, parentes e assessores nas mesas da birosca, e já levou a equipe do Cachambeer algumas vezes para pilotar eventos privados na cozinha da Gávea Pequena.
O gosto do alcaide pela comida e pela bebida do bar já foi parar inclusive em tretas de palanque. Até as traças do Palácio Guanabara sabem que quando o governador Cláudio Castro, num discurso mês passado, abordou o gosto do prefeito e futuro adversário nas urnas em 2026 pelos “botecos no fim de semana”, estava se referindo em parte às visitas do prefeito ao Cachambeer. O que pouca gente sabe é que o nosso governador evangélico também já andou entornando muitas… adivinha aonde? Na birosca do Marcelo. A única diferença é que Castro optou por um aparato de segurança digno de guerra ao tráfico para se deslocar das Laranjeiras até o Grande Méier.
Cenas do Cachambeer: a galeria de fotos com
políticos e celebridades é um dos orgulhos da casa
Mas a terceira e mais importante razão, caro leitor, não poderia ser outra que não o próprio dono… A personalidade única do Marcelo, que alia aquela irreverência de quem frequenta as quebradas do subúrbio desde a barriga de dona Aparecida com uma capacidade invejável de contar e recontar histórias, sempre com um detalhe a mais, e ainda deixar à vontade absolutamentre quem quer que seja, são os seus maiores trunfos. E o que realmente credenciou o Cachambeer a ser uma atração gastronômica e cultural permanente do subúrbio, do Rio e do Brasil.
Tanto é que a classe política está longe de ser a única a bater ponto por lá. No futebol, além de ser hoje posto avançado de vascaínos ilustres como o presidente Pedrinho, Carlos Germano, Felipe e Geovane, a casa já teve mesa cativa para Eurico Miranda fumar seus charutos. Carlos Eugênio Simon apitou três Copas do Mundo e comemorou dois aniversários no Cachambeer. Quando jogava na Rússia e voltava ao Brasil para tirar férias, o ex-craque do futsal Vander Carioca ia direto do aeroporto, de mala, cuia e matrioska, esquecer a neve e a vodca tomando chope no bar.
No jornalismo o Cachambeer também é unanimidade – especialmente o esportivo. Alex Escobar já abriu a casa fora do horário, para comemorar aniversário. O narrador Gustavo Villani é parceiro recorrente de copo do Marcelo, e todo ano o Marcelo Barreto lidera a comemoração de fim de ano do Redação SporTV nas mesas da casa. Atores, diretores, artistas plásticos e outras celebridades aparecem às pencas nas fotos e vídeos espalhados pelas paredes da casa – tudo exibido sempre com orgulho.
Ele mesmo uma celebridade, Marcelo ainda guarda a simplicidade genuína de se encantar de verdade em ver gente famosa frequentando a sua casa. Ainda que trate todo mundo, rigorosamente, como se fosse o colega de rua soltando pipa numa lage qualquer na Barreira do Vasco. Com respeito, mas sem frescura. “Certo, madame?”
Ah, e antes de ir embora, não esqueça: “Toma mais uma antes do táxi chegar! Se não der tempo, leva o copo. Depois você devolve!…”