É dezembro, chegou o Natal e a impressão é de que cada vez fica mais curto o tempo entre um e outro. Inicia-se, então, a época do ano em que, para a maioria da humanidade, afloram os sentimentos de união, alegria e generosidade. É o conhecido espírito de Natal.
Sem dúvida, é uma época caracterizada por um aumento da prodigalidade e solidariedade. As campanhas de doações, caridade e altruísmo se multiplicam e tornam-se frequentes. Mesmo sendo uma comemoração cristã, é inegável que o Natal ultrapassa os limites da religião, fazendo com que pessoas sem nenhuma crença se deixem atrair e participem das festividades. Todavia, com o meu espírito contestador, fico cá a me perguntar se essa generosidade sazonal não se aproxima da superficialidade. Por que a bondade é intensificada apenas no período natalino? É claro que a mesma generosidade e empatia deveria ser praticada durante todo o ano, ou não? As dúvidas me fazem questionar a autenticidade e motivação dessas ações com data marcada. Mas, passa longe de mim a intenção de condená-las, pelo contrário. Se a bondade não pode ser diária, que pelo menos seja presente no Natal.
Um outro aspecto costumeiramente criticado, sem nenhum resultado prático, é a comercialização exacerbada da data. A pressão para comprar, doar e receber presentes, certamente ofusca os valores mais profundos que a celebração deveria representar. O apelo ao consumo desenfreado de vestimentas, bebidas, alimentos e “lembrancinhas”, pode ser visto como uma condenável distorção dos princípios de generosidade e compartilhamento, criados pelo Reis Magos. Isso me faz refletir como é importante mantermos sob controlado equilíbrio o desejo de agradar os entes queridos com presentes de bom gosto, mas sem ceder à ostentação e ao excesso financeiro que muitas vezes constrangem os agraciados menos abastados.
É claro que a participação nas tradições natalinas, tais como decorar a árvore, trocar presentes e compartilhar uma refeição festiva é importante e deve ser estimulado. Estou convicto de que mesmo os não cristãos, ao participarem dessas práticas, percebem que elas fortalecem os laços familiares e comunitários, promovendo um salutar sentimento de pertencimento. E isso porque o reconhecimento da importância de ajudar o próximo e cultivar a generosidade é eticamente obrigatório e independe de crença religiosa. Não esqueçamos que nós, os seres humanos, temos o livre arbítrio para sermos bons ou maus, sem desculpas, já que nos jactamos, arrogantemente, de sermos os únicos seres vivos com capacidade de pensar e raciocinar.
Todavia, mesmo com todos os possíveis arranhões no espírito de Natal, até mesmo quando a festividade se afasta demais da sua fé religiosa, é a época mais apropriada para solidificar amizades, cristalizar as generosidades e promover profundas reflexões pessoais.
Feliz Natal!
Estimado Alfeu. O pensamento expresso no seu texto é o mesmo que me aflige. Diga-se de passagem, ao longo de minha já longeva existência, tenho acumulado maior número de dúvidas do que de certezas. Falta-me desvendar o grande mistério, aquele que a “indesejada das gentes” me revelará.