O Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAPN+ é celebrado neste sábado (28), mas a representatividade política da comunidade no Rio ainda está longe do ideal. Embora o grupo represente cerca de 2,3% da população fluminense, os poucos parlamentares que se autodeclaram LGBTQIAPN+ na Câmara do Rio e na Assembleia Legislativa (Alerj) ainda enfrentam barreiras para garantir voz efetiva e inserir suas pautas no debate legislativo.
Na capital, ao menos três dos 51 vereadores já se declararam publicamente parte da comunidade: Maíra do MST (PT), Monica Benicio (PSOL) e Tainá de Paula (PT) — atualmente licenciada do cargo para comandar a Secretaria municipal de Meio Ambiente e Clima.
Na Alerj, o número é ainda menor. Das 70 cadeiras, ao menos três deputadas se identificam como LGBTQIAPN+: Dani Balbi (PCdoB), primeira e única parlamentar transexual do estado; Verônica Lima (PT) e Dani Monteiro (PSOL).

Sub-representação da comunidade LGBTQIAPN+
Para Dani Balbi, inclusive, esse cenário reflete a profunda sub-representação da comunidade LGBTQIAPN+ no estado, tanto no número de parlamentares eleitos quanto na inclusão de suas pautas nas discussões institucionais. Ela menciona seu projeto de criação de comitês de diversidade nos órgãos públicos, que foi derrubado em plenário.
“Sofremos uma violência sistemática, uma perseguição política para que pautas propostas por nós também não prosperem. Um exemplo disso foi o projeto de criação de comitês de diversidade nos órgãos públicos — uma proposta ampla, que tratava sobre uma grande variedade de temas — derrubado em plenário após um acordo da casa ser rompido por parlamentares da extrema-direita”, lamenta a deputada.
‘Isso limita a própria qualidade da discussão’
Balbi também afirma que, embora haja avanços pontuais, são poucos os parlamentares que assumem a pauta LGBTQIAPN+ como prioridade:
“Isso limita a própria qualidade da discussão, que muitas vezes acontece sob o prisma do preconceito e da desinformação. Questões centrais para a nossa comunidade — como o combate à violência contra pessoas trans, o acesso a serviços públicos inclusivos e a promoção da empregabilidade e da educação — permanecem secundarizadas”, completa.
Lentidão e retrocessos no debate
Dani Monteiro compartilha opinião semelhante. Segundo a deputada, “ainda há um longo caminho na busca por representatividade política, tanto no âmbito fluminense quanto nacional”. Ela reconhece avanços nos últimos anos, mas ressalta que “não dá para ignorar a lentidão e os retrocessos impostos por setores conservadores” em relação à comunidade LGBTQIAPN+.
“O número de parlamentares que fazem parte da comunidade ainda é pequeno se comparado ao todo, mesmo nos partidos progressistas, e esse fato, por sua vez, acaba culminando em um número de pautas abaixo do necessário para garantir os direitos da comunidade LGBTQIAPN+, especialmente se ainda considerarmos a resistência normalmente feita pela oposição em propostas deste tipo”, destaca.
‘Cerca de 12% da população brasileira’
Como presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania, Dani também destaca que a pauta deveria ser uma “urgência democrática”.
“Garantir os direitos individuais dessa população, lutando lado a lado contra violências, é o mínimo que deveria ser defendido por todos, principalmente pelos heterossexuais. E ampliar essa presença política é uma urgência democrática. Estamos falando de 12% da população brasileira, e, dentro deste número, ainda há pessoas trans, negras, periféricas, com deficiência e tantas outras identidades marginalizadas. É preciso investimento real”, enfatiza a parlamentar.
A questão também enfrenta obstáculos na Câmara
Na Câmara Municipal, a vereadora Maíra do MST reforça os desafios. Ela acredita que os espaços institucionais ainda refletem uma estrutura social patriarcal, racista e heteronormativa.
“As casas legislativas do Rio ainda são majoritariamente compostas por homens, brancos e heterossexuais, essa é, infelizmente, a cara hegemônica da política institucional ainda nos dias de hoje. As poucas vozes LGBTQIAPN+ eleitas enfrentam não só o desafio da representatividade, mas também a hostilidade de um ambiente político que segue reproduzindo discursos de ódio e exclusão”, destaca.
Projetos em tramitação na casa
Maíra critica, inclusive, projetos que considera um retrocesso, como o do vereador Dr. Rogério Amorim (PL), que propõe proibir a participação de menores de 16 anos nas Paradas do Orgulho LGBTQIAPN+ na capital. A proposta prevê multa de R$ 5 mil por criança ou adolescente presente e notificação ao Conselho Tutelar. Ideia semelhante também foi apresentada na Alerj por Douglas Gomes (PL).
“É um exemplo claro de como esses temas ainda são tratados como tabu e mobilizam amplos setores para atacar nossos direitos. Assim, acredito que ainda não estamos suficientemente representados. Já existem muitas pessoas comprometidas com as pautas, e isso é necessário e importante de ser valorizado! Mas ainda há muitos desafios para que possamos estar em condições melhores para a construção da política LGBTQIAPN+”, afirma a vereadora do PT.
Lei Luana Delalabary
Atualmente licenciada da Câmara e à frente da Secretaria municipal de Meio Ambiente e Clima, Tainá de Paula complementa o debate. Para ela, a sub-representação compromete a aprovação de projetos voltados às necessidades específicas da comunidade LGBTQIAPN+, como evidenciado na tramitação da Lei Luana Delalabary, de 2021.
“A lei, que trata do Boletim de Dados de Direitos Sexuais, teve seu parágrafo único no artigo segundo, que mencionava ‘identidade de gênero e orientação sexual’, suprimido sob a alegação de que seriam sinônimos das pautas LGBTQIAPN+. Isso demonstra um desconhecimento e uma resistência em reconhecer a especificidade dessas questões”, critica.
Representatividade LGBTQIAPN+ no Rio
Por fim, Tainá ressalta que representatividade não é apenas ocupar espaços ou apresentar projetos temáticos.
“Legislar para a população LGBTQIAPN+ não é apenas criar leis específicas, mas sim repensar todas as possibilidades de acesso à cidade. Isso inclui garantir moradia digna, acesso equitativo à saúde e inclusão no mercado de trabalho, combatendo a discriminação em todas as esferas. É uma abordagem transversal que visa promover a cidadania plena e a qualidade de vida para todos”, conclui.