O Ministério Público Federal (MPF), em parceria com outros órgãos, visitou o antigo prédio do Instituto Médico-Legal (IML), na Lapa, Região Central do Rio, para avaliar o estado de conservação de documentos históricos encontrados no local, datados entre as décadas de 1930 e 1960, incluindo materiais da ditadura militar. A inspeção aconteceu na última quinta-feira (27).
Na visita, o MP revelou a existência de registros que podem conter informações sobre desaparecidos políticos e violações de direitos humanos durante a ditadura. Os documentos, em condições precárias, incluem livros de registro de óbitos que foram fundamentais para localizar o paradeiro de 15 desaparecidos políticos. Muitos desses registros se referem a pessoas enterradas como indigentes no Cemitério Ricardo de Albuquerque.
Ditadura militar completa 61 anos
Nesta segunda-feira (31), completaram-se 61 anos do golpe militar de 1964, que depôs o presidente João Goulart e instaurou uma ditadura militar no Brasil (1964-1985). Durante esse período, o país viveu sob um regime autoritário, marcado pela censura à liberdade de expressão, repressão política contra opositores e diversas violações de direitos humanos.
A visita desta quinta contou com a participação de representantes de diversas instituições, como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac), o Arquivo Público do Estado do Rio (Aperj), a Secretaria Estadual de Polícia Civil (Sepol), a Universidade Federal do Rio (UFRJ), o Grupo Tortura Nunca Mais e o Coletivo Memória, Verdade, Justiça e Reparação.
Prédio estava desativado desde 2009
O prédio, que funcionou por mais de 60 anos, está desativado desde 2009, quando o IML foi transferido para outro local. Durante a inspeção, o procurador Regional dos Direitos do Cidadão adjunto, Julio Araujo, enfatizou a importância da preservação desse acervo, essencial para a reconstrução da memória histórica do país.
“Foi constatada a presença de documentos de relevância histórica. A partir de agora, será crucial debater e definir como coletar esses documentos e destiná-los ao Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro”, destacou Araujo.
Desaparecidos da ditadura
Felipe Nin, do Coletivo Memória, Verdade, Justiça e Reparação, afirmou que os documentos encontrados no antigo IML podem trazer informações sobre desaparecidos durante a ditadura militar.
“Com base nos documentos encontrados pelo Grupo Tortura Nunca Mais no prédio do IML, por meio dos livros de registro de óbitos, foi possível localizar o paradeiro de 14 desaparecidos políticos e, posteriormente, de um 15º. Esses desaparecidos estavam enterrados como indigentes no Cemitério Ricardo de Albuquerque. Isso indica que outros desaparecidos também podem ser identificados a partir das informações contidas nesses documentos”, explicou.
Luta pela preservação
A visita ao prédio foi considerada fundamental pelo Grupo Tortura Nunca Mais. Para Rafael Maui, integrante do grupo, a iniciativa marca o início de um novo ciclo na luta pela preservação e pesquisa das violações de direitos humanos no Brasil. Segundo ele, esses registros não se limitam ao período da ditadura militar, mas abrangem um contexto histórico ainda mais amplo.
“O que vemos aqui é uma verdadeira abertura dos arquivos da repressão, algo pelo qual lutamos há muito tempo. Esse processo não só permite o acesso a esses documentos, como também contribui para esclarecer os fatos e garantir a memória do país”, afirmou Maui.
Os próximos passos
Após a visita, uma reunião realizada na sede da Procuradoria da República do Rio (PR/RJ) discutiu os resultados da inspeção no IML. Foi debatido, em conjunto com a Sepol, um calendário de visitas ao local, com o objetivo de verificar a quantidade de registros e avaliar seu estado de conservação, para definir uma estratégia de organização do acervo. Em um segundo momento, será analisado um local adequado para a guarda provisória dos documentos.