Enquanto filmes como “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, conquistam reconhecimento internacional no Oscar, outras produções, feitas nas comunidades do Rio, ainda buscam seu espaço. É o caso de “Pátria Amada”, curta-metragem realizado em 2024 por jovens das periferias do Alto da Boa Vista, na Zona Norte do Rio, recentemente selecionado para a 18ª edição do Festival Visões Periféricas.
O curta é fruto da Oficina de Audiovisual e Novas Tecnologias do projeto “Estudos, Câmera e Ação”, ministrada pela educadora Paula Marques, da ONG Asbrinc, que atua na comunidade do Alto da Boa Vista desde 2004. Durante a oficina, os jovens se apropriam da linguagem cinematográfica e criam seus próprios filmes com recursos acessíveis, como celulares.
“A oficina tem justamente o objetivo de incentivar os jovens a se apropriarem da linguagem audiovisual e produzirem filmes com as ferramentas que têm à disposição. ‘Pátria Amada’ foi inteiramente gravado e editado no celular, para que eles entendessem que o cinema é possível e que podem ser protagonistas de suas próprias histórias”, explica Paula Marques.

Releitura de Ilha das Flores (1989)
O filme surgiu a partir de uma reflexão dos jovens sobre Ilha das Flores (1989), de Jorge Furtado, que aborda a fome e a desigualdade social no Brasil. Impactados pela crueza da realidade retratada no documentário, eles decidiram criar uma releitura com base em suas próprias vivências e perspectivas.
“Quando exibi Ilha das Flores na oficina, eles ficaram muito chocados e indignados, porque, infelizmente, aquela realidade ainda é atual. A partir das discussões que surgiram, tivemos a ideia de fazer uma nova versão, com a linguagem deles”, conta Paula.
A produção contou com o engajamento total dos jovens, que se dividiram entre as funções de direção, filmagem, atuação e preparação do figurino. Luiz Santos, de 15 anos, cujo rosto estampa o pôster de “Pátria Amada”, destaca a importância do filme em sua trajetória.
“A criação do curta e as discussões durante as gravações me fizeram enxergar como a fome e a desigualdade são uma triste realidade que não podemos aceitar. A educação e a cultura não só me tornaram um ser humano melhor, mas também me ajudaram a entender a sociedade em que vivemos”, afirma.

Reconhecimento no festival
O reconhecimento no festival foi uma grande conquista para os jovens, que, no ano passado, também foram selecionados para a Mostra Geração do Festival do Rio com o curta 18 de Maio, um filme de conscientização sobre o combate à exploração e ao abuso sexual de crianças e adolescentes.
A participação em festivais tem sido um grande incentivo para os alunos, que veem no cinema uma poderosa ferramenta de transformação social e pessoal. Leonardo Bernardo, de 15 anos, aluno da Asbrinc desde 2021, compartilha sua experiência.
“Antes de fazermos o filme, pesquisamos vídeos e notícias sobre a fome e a desigualdade para nos inspirarmos na construção do roteiro, e isso mudou muitos dos meus pensamentos. No futuro, gostaria de me tornar fotógrafo profissional, apesar de não ser meu plano principal. O projeto me deu um incentivo e me mostrou que isso realmente pode ser possível”, diz.
Festival acontece de 13 a 16 de março
Os jovens participantes do projeto são moradores das comunidades da Mata Machado, Morro da Agrícola, Morro do Açude, Tijuaçu, Tijuquinha e Vale Encantado, todas situadas no Alto da Boa Vista. O filme foi produzido pela Supimpa em parceria com a Associação Cultural Imaginário Digital.
O Festival Visões Periféricas comemora 18 anos destacando a diversidade do audiovisual brasileiro. A edição de 2025 acontece de 13 a 16 de março, com mostras competitivas presenciais no Estação Net Botafogo, na Zona Sul do Rio. Nos dias 17 e 18, parte da programação estará disponível online no site oficial do evento.
Ficha técnica
Direção, edição e roteiro:
Paula Marques
João Gabriel Prado
Elenco:
Ana Clara Sobreira
Arthur Brito
Pedro Navega
Pedro Henrique Paz
Leonardo Bernardo
João Gabriel Prado
Nicolas Braga Menegatti
Luiz Augusto
Bernardo Gomes
Lucas Jesus
Maria Eduarda Rosa
Dominique Matheus
André Mario Santos
Jorge Lucas Santos
João Davi
Fotografia:
Dominique Matheus
João Gabriel Prado
Narração:
Maria Eduarda Rosa
Figurino:
André Mario
Jorge Lucas Santos
Luiz Augusto
Pedro Henrique Paz