Uma cidade subaquática. Assim podemos descrever um emaranhado de enormes proporções de plataformas de petróleo e gás offshore. Com sua imponência, elas resistem à passagem do tempo fixadas no fundo do oceano. Do tamanho de um edifício, elas estão ali submersas servindo muitas vezes de habitat para a fauna e flora marinha. Gigantes e envelhecidas, elas precisarão ter um destino final, já que cumpriram seu ciclo de vida. Em breve, os Estados precisarão tomar decisões sobre o que fazer com elas. Desmantelar em pedaços que possam ser transportados até terra e buscar por reciclagem ou permanecer no local para qual foi desenvolvida. Qualquer uma das opções traz enormes riscos tanto ambientais quanto de vidas humanas. É nesse cenário que iremos abordar a temática de Rigs to Reef para descomissionamento das plataformas petrolíferas. Assunto necessário e relevante tanto para o direito ambiental quanto para direito empresarial e econômico, uma vez que envolve grandes perdas financeiras e ambientais.
Em todo mundo, existem mais de 12 mil plataformas, logo é necessário pensar o que fazer quando essas estruturas não puderem mais produzir combustível. Assim começam as discussões sobre como os países, empresas e sociedade civil poderão agir para resolver um problema de grandes proporções. Nos Oceanos já temos plataformas extintas e retirá-las do local em que foram construídas exige muita capacidade técnica para que não contamine o meio marinho e isso torna o processo incrivelmente caro.
Quando obsoletas, as plataformas de petróleo e gás precisam passar por um processo conhecido como descomissionamento. O que seria isso? Um processo de remoção parcial ou completa da estrutura. Essa remoção completa eliminaria não somente o aço, mas também uma grande parte da biomassa e dos peixes ali existentes. Assim como os seres humanos, a fauna aquática se adapta as mais variadas condições de vida. Essas estruturas viraram habitat para esses animais marinhos, oferecendo material enriquecido como blocos rochosos no fundo do mar sendo complexa e produtivas.
Muitos ambientalistas questionam como pode ter tanta vida em um local que foi danificado pela indústria. Um verdadeiro enigma surge nas profundezas de um mar sem fim. É nessa linha de raciocínio, que Estados estão discutindo em como retirar essas plataformas sem que haja mais danos ao meio ambiente. Surge então um plano alternativo: Rigs to Reef ou para o português recifes artificiais.
Nos Estados Unidos, a lei do legado de Recursos Marinhos da Califórnia desde 2010 permite que empresas do setor petrolífero removam parcialmente suas estruturas petrolíferas offshore que já cumpriram seu ciclo vital como forma alternativa de remoção completa, obviamente desde que os requisitos ambientais e legais sejam atendidos.
No Brasil temos cerca de 40 plataformas que já atingiram a idade limite para o processo de descomissionamento e temos mais 24 em vias de atingir o limite. Mesmo sabendo desse problema, o governo brasileiro, sociedade civil e setores econômicos parecem não se importar ou mesmo não ter ideia do que está por vir. Olhando para outros países, vemos que a discussão já está sendo assumida nas agendas ambientais e econômicas por pelo menos 1 década. Os debates levam em consideração as questões técnicas e ambientais.
A sociedade brasileira parece nunca ter ouvido falar sobre o problema que está ali até que ele se apresente em forma de desastre ambiental. Daí sim, todos passarão a falar do assunto. Na realidade brasileira o que observamos é algo temerário, não temos regulação sólida nem caderno de boas práticas que possam auxiliar as empresas petroleiras. Como cumprir regras no Brasil se nem mesmo existe um Plano Nacional de Descomissionamento?
O fato de não possuir legislação específica capaz de tratar do tema gera insegurança jurídica para as empresas e meio ambiente. Muitas incertezas e divergências técnicas permeiam essa questão. Nessa linha de frente, temos três órgãos que não interagem, revelado a cada palavra escrita nas normas por elas desenvolvidas. IBAMA, ANP e Marinha do Brasil parecem não entender a real necessidade que se apresenta com o envelhecimento das estruturas.
Aconteça o que acontecer, a questão é que a extração de petróleo não será mais viável e em algum momento irá acabar. Surgirá então o confronto entre as empresas e Estados sobre o que fazer com elas. Está na altura de iniciarmos uma nova mentalidade mais criativa e aberta a soluções mais inovadoras sobre isso. O futuro dos oceanos e sua conservação passa por eles, não podemos ter preconceitos ao tratar de um tema extremamente relevante para nossa existência. Os oceanos merecem o destaque pela sua importância ambiental. Seu trabalho é silencioso, mas essencial para a manutenção da vida.
Leandro Mello Frota
Advogado Ambiental. Doutorando Agroambiental pela UFRRJ. Foi Diretor do ICMBio, Funasa e da OAB RJ