Barracas de artesanato, roupas coloridas, comida de rua e rodas de samba: o cenário das feiras de rua do Rio é conhecido. Espaços históricos da região central como Rua do Lavradio, Praça Quinze e Glória recebem, todas as semanas, são algumas das feiras mais tradicionais da capital. Além da circulação habitual de cariocas e turistas, esses pontos da cidade também se tornaram, recentemente, ponto de encontro para influenciadores digitais.
Nos últimos meses, o número de postagens e vídeos nas redes sociais divulgando as feiras culturais da capital cresceu e essa “trend” tem tido efeito no dia a dia de quem monta sua barraca nas ruas cariocas.
O comerciante Rafael Victor, que vende camisetas e souvenirs no Lavradio, Glória, Ipanema e Praça Quinze, conta que o sucesso das postagens sobre feiras culturais nas redes tem ajudado a melhorar os números de venda sem perder a essência do fenômeno, tão tradicional para a cidade.
“A gente tem visto muito influencer, muita gente postando sobre, e isso tem melhorado bastante o público. É um atrativo maior para os clientes e também faz mais gente conhecer esse circuito das feiras que faz parte da nossa cultura carioca também. É importante que quem vem conhecer o centro histórico do Rio conheça as feiras; é nossa história”, destaca o vendedor.

A professora de História Débora Andrade concorda. Nascida e criada no Rio, ela se mudou para Minas Gerais recentemente e, sempre que tem uma oportunidade de voltar ao estado, faz questão de visitar a feira da Praça Quinze ou da Glória para se reconectar com a identidade cultural carioca.
“A feira sempre esbanja a vida cotidiana do carioca e, como sinto falta do dia a dia do Rio, me sinto mais conectada com a vivência da cidade. O que mais gosto é da paisagem. Cada feira é única e tem diferentes propostas, mas o visual segue sempre a mesma estética e isso me agrada muito, porque me remete àqueles antigos mercados municipais gigantescos que existiam pelo Centro e em demais regiões fora da metrópole”, opina a professora.
Pós-pandemia também fortaleceu sucesso das feiras, aponta pesquisa
Além das redes, a pandemia de Covid-19 também teve um papel importante no resgate desse fenômeno na vida cultural da cidade. A geógrafa e professora Taiany Marfetan, que estuda feiras culturais, conta que, durante sua pesquisa sobre o assunto para o doutorado, percebeu que o comércio de rua voltou a ser muito mais popular após o período de crise enfrentado pelos comerciantes na pandemia.
“A pandemia potencializou essa característica que já existia – tanto pelo fato de muita gente ter perdido emprego e passado a trabalhar na feira, quanto pelo fato de as pessoas ficarem mais tempo em espaços abertos depois da pandemia, até por conta dessa questão do [distanciamento] durante o contágio. O fato é que, após a pandemia, as feiras livres cresceram muito”, destaca a pesquisadora.
Apesar do sucesso, feiras enfrentam desafios no contexto urbano
Ainda durante o estudo das feiras do Rio, Taiany percebeu que o crescimento de público também traz à tona alguns desafios que os comerciantes encontram na luta por sua permanência no cenário urbano. Uma das inseguranças que os feirantes costumam ter envolve a licença que permite o uso de área pública.
“Muitos não têm essa licença, que não é fácil de ser conseguida e a prefeitura pode, inclusive, suspendê-la a qualquer momento. Isso também acaba fragilizando um pouco os feirantes, principalmente os mais novos”, conta a pesquisadora.
Outro desafio envolve o acesso a banheiros para quem passa muito tempo vendendo nas barracas. “Uma das coisas que os feirantes reclamam bastante – e os frequentadores também – é a ausência de banheiros químicos nas feiras e nos eventos de samba também. É uma questão que acaba afetando diretamente o uso dessas áreas públicas, nesse contexto de democratização do acesso ao espaço”, reforça.

Mesmo com as fragilidades, muitos comerciantes não trocam a experiência da barraca de rua em dia de feira. Bruna Rangel, que vende roupas na Praça Mauá e na Praça Quinze, é uma dessas que, apesar das dificuldades, não troca a experiência da feira por nada.
“Trabalhei no comércio a minha vida toda e, depois que comecei a fazer feira, não consegui mais largar. Já trabalho assim há 10 anos. Não troco por nada. Claro que tem os perrengues, mas é muito bacana. O contato direto com o cliente na rua não tem preço”, conclui a feirante.

