Dizer que o nome do recém-inaugurado bar de coquetelaria popular da Lapa foi fruto de meses de pesquisa e estudo profundo do comportamento urbano seria um desrespeito à sensibilidade dos boêmios da cidade. E da sua também, caro leitor. Pois inauguro esta minha nova fase de anotações botequeiras semanais – agora hospedado nas novíssimas instalações físicas e digitais aqui do portal Tempo Real RJ – afirmando que o nome do Suru Bar (@surubar.rj), na Rua da Lapa 151, nasceu foi mesmo de um grande pileque. De uma grande confusão. De um imenso sururu.
No caso, dos sócios e idealizadores da casa, os bartenders Igor Renovato e Raí Mendes, que depois de algumas dúzias de ampolas mofadas numa madrugada qualquer acharam a combinação sonora um tanto instigante, bem humorada, sedutora e, porque não dizer, safada. Perfeita para batizar um bar concebido e parido no coração do coração boêmio do Brasil, quase 100% focado no serviço de drinques e coquetéis feitos com criatividade e bebidas brasileiras subvalorizadas no mundo da mixologia. Até agora…
Marcas que passam longe dos balcões engomadinhos da Zona Sul – no Suru Bar ganham ares de protagonistas das principais opções da carta de drinks e coquetéis. Além, é claro, das cachaças (que aqui merecem uma menção especial, pois já passou da hora de acharmos que cachaça é uma bebida de segunda categoria).
Nessa toada, a casa oferece clássicos nacionais como o Rabo de Galo (aqui feito com cachaça guardada em cerejeira, vermute Cinzano e o bistre de alcachofra Cynar), o Caju Amigo (cachaça branca, compota de caju e limão) e o Macunaíma (cachaça branca, Fernet, limão e xarope). Mas também traz criações autorais deliciosas e cheias de histórias. Como o já badalado Surubeba (feito com o clássico vinho composto Jurubeba Leão do Norte, Cinzano e Cynar). Tem também o Muquira, um mix de Campari com tônica de laranja preparado à feição do gosto e dos bordões do ícone boêmio carioca Sérgio Rabelo, dono do famoso Galeto Sat’s, fã confesso de Campari e famoso por chamar amigos e clientes de “muquirana”. E ainda o Pitty Descolada, uma mistura de rum com jambu, abacaxi, coco, cupuaçu e Ginger Ale, feita em homenagem à jornalista e defensora da cultura botequeira carioca Pitty Basílio, relações-públicas da casa. E não para por aí, na carta que conta com mais de 25 opções, entre autorais, típicos brasileiros e clássicos do balcão.
Na verdade, a valorização das bebidas populares no Suru Bar é muito mais que uma grande brincadeira. Para Igor e Raí, dois bartenders de origem humilde que conquistaram fama e prêmios no universo glamouroso das coquetelarias de luxo da Zona Sul, fazer mixologia com aperitivos brasileiros de pouco ou quase nenhum prestígio mercadológico é uma atitude política também. “Um dos nossos maiores prazeres é ver gente que nunca tomou um coquetel na vida provando as nossas criações aqui no bar”, diz Igor, lembrando também com orgulho da observação certeira feita por um cliente importante e já assíduo da casa, o sambista Gabriel da Muda: “Ele disse que era a primeira vez que via pessoas pretas num bar de coquetelaria, sem ser servindo mesas ou trabalhando no balcão”, rememora.
O balcão em verde rosa do Suru aliás, não chama atenção apenas pelas bebidas. A cozinha, democraticamente à vista do público, produz sabores tipicamente botequeiros feitos com técnica e capricho. À cargo da chef Roberta Antonia – formada por entre as grifes Alain Ducasse e Cordon Bleu mas amante de um bom botequim – o cardápio da casa traz delícias bem humoradas inspiradas não só no universo dos botequins cariocas, mas também no dos botecos de Belo Horizonte, cidade de origem do sócio Raí.
Na lista de imperdíveis eu indicaria os ovos rosa de codorna (aqui tingidos com um delicado molho de beterraba, ao invés da tradicional anilina dos pés-sujos tradicionais), os tradicionalíssimos e cada vez mais raros rollmops de sardinha enrolada em conserva de cebola, o pão de queijo frito com melaço e a boa e velha sacanagem de boteco (prato absolutamente necessário num bar chamado Suru…). Para fomes mais robustas, o sanduíche de cupim vem fumegantemente acebolado, e o talharim com almôndegas e queijo é uma homenagem ao Bolão Santa Tereza, de Belo Horizonte, que serve um prato muito semelhante a qualquer hora da madrugada. De sobremesa, uma combinação tripla de goiabada, queijo Canastra e doce de leite, cujo nome não poderia ser outro: Trisal.
O Suru Bar inaugurou não tem dois meses, mas já afirmo sem medo de errar: pela qualidade, originalidade e coragem de abrir suas portas numa Lapa ainda combalida pela pandemia, vai ser um dos destaques da gastronomia popular carioca em 2024. Ou não me chamo Juarez Becoza!