Lara Mara, neta de Celsinho da Vila Vintém — fundador da facção criminosa Amigos dos Amigos (ADA), preso, de novo, na última quinta-feira (08) — já foi homenageada, duas vezes, pela Câmara de Vereadores do Rio. A moça, de 20 anos, é presidente da Unidos de Padre Miguel (UPM) — escola rebaixada no último carnaval, depois passar apenas um ano no Grupo Especial.
No ano passado, ela recebeu a Medalha Pedro Ernesto, a maior honraria do legislativo carioca. O autor da proposta, Felipe Boró (PSD) justificou a ideia dizendo que a homenageada era a diretora de carnaval (cargo que ocupava, na época, na UPM) mais jovem do Rio. E que Lara Mara “simboliza a força e a garra da mulher, e a todos os moradores da nossa Vila Vintém”.
Boró não foi o primeiro. Em 2023, a neta de Celsinho já tinha recebido uma moção do vereador Márcio Santos (PV), atual secretário de Economia Solidária da Prefeitura do Rio.
Protesto contra a conduta dos policiais
No dia da prisão de Celsinho, Lara foi à Cidade da Polícia tentar ver o avô. Não conseguiu e gravou um vídeo para denunciar a conduta dos policiais durante a operação.
Estudante de Direito, ela acusou agentes de agredirem a Deise Mara de Sousa Rodrigues, de 62 anos, e outros parentes durante a ação na Vila Vintém, na Zona Oeste.
Traficante da velha guarda
Celsinho da Vila Vintém é considerado um dos criminosos mais antigos em atividade no estado, É apontado como um dos fundadores e chefe da facção Amigos dos Amigos (ADA), rival do Comando Vermelho (CV) e do Terceiro Comando Puro (TCP).
Condenado por tráfico de drogas, roubo e organização de quadrilha, Celsinho foi preso pela primeira vez em 1990. Em 1996, foi parar na prisão novamente, mas acabou fugindo em 1998, vestido de policial militar, quando estava no Hospital Penitenciário Fábio Macedo Soares. Foi preso, mais uma vez, em 2002, até ganhar a liberdade em 2022. Ao deixar a cadeia, disse que tem problemas de saúde e não se envolveria mais com o crime.
“Vou procurar alguma coisa para fazer, ficar tranquilo. Não vou me envolver com nada, não. Eu não me envolvo há muitos e muitos anos. Vou tentar viver uma nova vida”, disse.
Acordo com miliciano e com chefe de facção rival
As investigações que levaram à última prisão de Celsinho começaram em 26 de fevereiro, com a prisão em flagrante de oito traficantes armados na favela da Vila Sapê, em Curicica, Zona Oeste. Em depoimento, eles disseram ter sido enviados por Celsinho com a missão de assumir o controle da área, até então dominada pela milícia de André Costa Bastos, o “Boto”, atualmente preso em um presídio federal.
O relato dos traficantes revelou uma transação criminosa: mesmo de dentro da prisão, Boto teria negociado a “venda” da Vila Sapê a Celsinho, que imediatamente enviou tropas da facção ADA para ocupar a favela e iniciar as atividades de tráfico. A ausência de resistência chamou a atenção da inteligência da Polícia Civil, que passou a monitorar a movimentação, suspeitando de uma aliança entre os grupos.
Com o avanço da investigação, os agentes descobriram que o acordo de Celsinho ia além de Boto. Ele também teria firmado um pacto com Edgar Alves de Andrade, conhecido como Doca ou Urso, chefe do Comando Vermelho (CV) — facção historicamente rival da ADA. O objetivo da aliança era garantir o controle pacificado da região de Curicica e arredores, unindo interesses para evitar conflitos e promover a divisão territorial de forma coordenada.
O pacto previa inclusive ações armadas conjuntas, como a execução do miliciano dissidente Fábio Taca Bala, morto por traficantes do CV por se opor à entrada da ADA na região. A ofensiva teria sido autorizada pelo alto comando da facção, em comum acordo com os demais líderes.
A partir de depoimentos, provas técnicas, movimentações no sistema penitenciário e interceptações telefônicas, a Polícia Civil concluiu que Celsinho, Doca e Boto integravam uma associação criminosa voltada à exploração do tráfico de drogas em áreas estratégicas da Zona Oeste. O grupo atuava com armamento pesado, intimidação de moradores, homicídios e ocupações pactuadas entre as facções e a milícia.