Neste mês, a lei sancionada pelo governador Cláudio Castro (PL), que prevê o pagamento de um bônus de R$ 5 mil a policiais civis e militares do Rio por cada fuzil apreendido completa dois anos. Segundo dados do Instituto de Segurança Pública, entre agosto de 2023 e maio de 2025, foram apreendidos 1.200 fuzis no estado. O montante equivale a um custo de R$ 6 milhões aos cofres públicos.
Segundo o governo do estado, um dos objetivos da medida é reduzir a letalidade policial.
“Essa é mais uma ação estratégica no nosso governo. Fuzil é arma de guerra. Quanto mais tirarmos das mãos dos bandidos, menos será necessário que os nossos policiais usem”, escreveu Cláudio Castro nas redes sociais à época em que a medida foi decretada.
Investimento ou gasto?
A medida, no entanto, gera controvérsia no campo da segurança pública. Enquanto alguns especialistas defendem a bonificação como um “reconhecimento do esforço dos policiais”, outros se preocupam com a criação de um sistema de metas baseado em gratificação.
Para Daniel Hirata, coordenador do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni), da Universidade Federal Fluminense (UFF), a premiação de R$ 5 mil por fuzil apreendido pode distorcer os indicadores de segurança no estado.
“A maior parte dessas apreensões me parece que tem sido feita justamente durante operações policiais. E há um investimento altíssimo para a realização de uma operação, para apreensão de uma quantidade muito pequena de fuzis”, argumentou Hirata.
Já o antropólogo e ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope), Paulo Storani, defende a medida como um estímulo à atividade policial.
“Essa política de metas ou remuneração por meta atingida já foi adotada em governos anteriores e é muito inteligente ao promover, de forma direta, a integração entre as instituições policiais. A remuneração paga por fuzil apreendido é um reconhecimento do esforço dos policiais. O governo entende que é estratégico reduzir o número de fuzis nas mãos de criminosos”, declarou.
Hirata, por sua vez, ressalta a importância de investigações mais estruturadas:
“O que me parece desejável é a condução de investigações específicas, com grupos especializados para atuar nas redes de fornecimento — os chamados ‘matutos’, ou seja, as pessoas que trabalham na distribuição desses armamentos”, afirmou.
Para onde vão os fuzis apreendidos
Segundo o governo do estado, “as armas de fogo apreendidas passam por uma análise rigorosa antes de qualquer possibilidade de reaproveitamento”. Depois de uma perícia, são avaliadas a origem, integridade e condições de uso. Só com autorização judicial e após atenderem a todos os critérios técnicos, essas armas podem ser destinadas às forças de segurança.
Esse processo é conduzido pela Polícia Civil, responsável pela produção do laudo técnico, avaliação do armamento e representação junto ao Judiciário. Armas que não atendem aos padrões exigidos são encaminhadas para destruição pelo Exército.

Fuzis do crime
De acordo com dados mais recentes da Secretaria de Segurança Pública, só a Rocinha, a maior favela do Rio, contém cerca de 1,5 mil fuzis. O número é sete vezes maior que o arsenal médio de um batalhão da Polícia Militar.
Mesmo sem produzir armas ou munições, o Estado do Rio de Janeiro lidera o número de fuzis apreendidos no país. Apenas em 2025, 322 fuzis já foram retirados das ruas — número que representa quase metade das apreensões registradas em todo o território nacional.
No último ano, o Rio registrou a maior apreensão de fuzis da série histórica. Foram 732 fuzis entre janeiro e dezembro de 2024, um recorde histórico desde 2007. A média foi de dois fuzis apreendidos por dia no ano passado, em um aumento de 20% de 2023 a 2024 – de 610 para 732.
Storani também citou um levantamento realizado para a Polícia Civil que estima 56 mil integrantes em facções criminosas (entre traficantes e milicianos) no estado. Segundo ele, pelo menos metade desse grupo está armada — e cerca de 25 mil fuzis estariam nas mãos de criminosos.
“Fuzil é arma de guerra. Então, o governo do Rio entende que a política de remuneração variável, como essa bonificação por fuzil, estimula os policiais para essa atividade e reconhece o risco inerente à atuação nesse tipo de confronto”, concluiu.