Uma denúncia sobre o calor intenso em escolas do Rio foi apresentada ao Ministério Público Estadual (MPRJ). O documento é assinado pelo Instituto Alana, Casa Fluminense, WWF-Brasil, Frente Parlamentar por Justiça Climática da Assembleia Legislativa (Alerj), pela Rede por Adaptação Antirracista e grêmios estudantis.
O documento reúne dados recolhidos no recente estudo “O Acesso ao Verde e a Resiliência Climática nas Escolas das Capitais Brasileiras”, realizada pelo Instituto Alana a partir de dados levantados pelo MapBiomas, e apresenta recomendações de atuação ao poder público, no sentido de assegurar o exercício dos direitos das crianças e adolescentes a espaços educacionais adequados, permanência estudantil e justiça ambiental e climática.
A representação se ampara na regra e princípio constitucional da “absoluta prioridade de crianças e adolescentes” e na figura da proteção socioambiental e climática expressas nos artigos 225 e 227 da Constituição Federal, reiterando o “essencial papel de todos os poderes na garantia da absoluta prioridade e proteção integral dos direitos e melhor interesse de crianças e adolescentes e do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, de modo que este seja defendido e preservado para as presentes e futuras gerações”.
Além do calor, alagamentos atrapalham alunos
Além do calor, o Estado do Rio já registrou também alagamentos neste verão e municípios como Bom Jardim, Nova Friburgo e Teresópolis estão em alerta. Guilherme Lobo, advogado do Instituto Alana, comentou sobre o tema.
“Frequentar as aulas com essas temperaturas se tornou mais difícil e desafiador, pois essa é a época do ano em que muitas escolas têm interrupções no abastecimento de água, sobretudo nas regiões mais vulneráveis e periféricas, um cenário que cresce à medida que as áreas verdes desaparecem das escolas e de seus entornos. Trata-se de uma urgência absoluta: é preciso preparar melhor as escolas”, diz.
Dados do estudo elaborado pelo MapBiomas revelam que, na cidade do Rio de Janeiro, 34% das escolas, nas quais estudam 160 mil alunos, não possuem nenhum tipo de cobertura vegetal. A situação se agrava em favelas, onde esse número sobe para 46,23% das escolas. Outro dado alarmante é que 80% das escolas registram temperaturas acima da média da cidade.
Escolas em ilhas de calor
Ao analisar esses números sob um recorte de raça, o estudo mostra que 29,8% das escolas em que mais de 60% dos alunos se declaram negros estão situadas em ilhas de calor. Outro fator relevante é que 117 escolas estão em áreas de risco climático, com quase 20 mil estudantes em locais onde pode haver deslizamentos, enchentes e outros perigos. As escolas em áreas de risco representam 21,36% das escolas frequentadas por população majoritariamente negra, enquanto apenas 0,85% são frequentadas por população majoritariamente branca.
“As altas temperaturas nas escolas estaduais do Rio de Janeiro não são apenas um problema de infraestrutura, mas uma grave questão de justiça climática. São milhares de estudantes, funcionários e professores expostos a condições degradantes. A omissão do governo impacta diretamente no aprendizado e na saúde da comunidade escolar, cerceando esses alunos do direito à educação e aprofundando desigualdades”, diz o deputado estadual Flavio Serafini, presidente da Frente Parlamentar por Justiça Climática da Alerj.
Para o grupo que apresentou a denúncia, é fundamental que, em atendimento aos dispositivos constitucionais, se adotem com urgência planos climáticos adequados e medidas relevantes para garantir a saúde e o bem-estar das crianças e adolescentes que vivem no Rio de Janeiro.
“Hoje, não há, nos orçamentos estadual e municipal, previsão de recursos para adaptação das escolas às mudanças climáticas, que precisam ir muito além de climatização, considerando soluções de médio e longo prazo baseadas na natureza para transformar as escolas”, explica Lobo.
O objetivo principal da denúncia é que seja instaurado um procedimento administrativo, a fim de que se adotem e implementem planos climáticos e de educação adequados e suficientes, bem como outras medidas relevantes, tanto em âmbito municipal como estadual.
Isso passa pela elaboração de um plano de ação que contenha metas e previsões orçamentárias específicas, além de promover um debate amplo e transparente com todos os atores sociais e ambientais envolvidos, por meio de uma audiência pública com participação social qualificada.