Das casas de ópio descritas por João do Rio aos áureos tempos rock’n roll do Circo Voador e das rodas de samba da Rua do Lavradio, passando pelo reinado da lendária Madame Satã. A Lapa sempre surpreende quem decreta o seu fim — e se reinventa.
Desde o segundo semestre do ano passado, as novidades fervilham. Tem casa nova, como o Celeste e o Suru Bar. Tem a tradição mantida e recuperada, como o Nova Capela tinindo de… antigo. Sem problema de convivência com as torneiras modernas do Brewteco. Tudo sempre à sombra dos arcos mais estilosos do Rio.
Suru Bar
No comecinho de janeiro deste ano, precisamente no dia 6, nascia ali na Rua da Lapa o Suru Bar. Pintado com as cores da Estação Primeira de Mangueira, o local é um ode ao samba. Carrega a famosa bandeira da “Indíos, negros e pobres” em uma de suas paredes e tem uma coleção empilhada de discos de vinil de sambistas.
Apesar da atmosfera carioca, as influências do bar e do seu cardápio são mineiras. Raí Mendes, bartender e um dos sócios do Suru, conta que a ideia do local é ter um pouco das duas personalidades. Ele é mineiro, enquanto o outro sócio, Igor Renovato, um dos craques da mixologia mais premiados da cidade, é carioca.
Sanduíche de cupim, talharim com almôndegas, e, claro, o legítimo pão de queijo mineiro são algumas das iguarias desse bar que nos leva de Minas à Mangueira, e vice-versa.
Desde esta sexta-feira (12), o bar passou a funcionar também durante o almoço “Vai ter mexido, que é um traço de BH (Belo Horizonte), Canjiquinha, algumas puxando mais pra Minas”, explica Raí. Ele conta que a escolha do local foi pela identificação: “O local tem que ter alma né… Custamos a achar o local e pensamos ‘tem que ser aqui'”. Para ele, faltava ali na Lapa um bar “da maneira que é o Suru”.
Boteco Bacurau
Em agosto de 2023, surgiu um dos botecos de grande destaque na cena atual: o Bacurau. Apesar do nome, o gerente Antônio garante que o tema do local é o Nordeste, e não propriamente o filme do diretor Kleber Mendonça Filho. “Bacurau é um pássaro muito comum na região”. ele explica.
O estabelecimento fica no antigo ponto do Bar das Quengas, que funcionou no nº 175 da Avenida Mem de Sá por anos. O Bacurau, apesar de já nascer com essa sombra, não o substituiu, mas criou sua própria personalidade. Servindo de caldos a espetinhos, além de seu famoso galeto, o boteco busca o equilíbrio entre a comida nordestina e os típicos petiscos da região.
Brewteco
Com a união entre bar carioca e cervejaria artesanal, o Brewteco chegou à Lapa em novembro de 2023 com seu autoproclamado “Bar da Fábrica”, que funciona no nº 38 da Rua do Rezende. O apelido não é por acaso: o bar coexiste com os tanques de cerveja e a adega para envelhecimento das bebidas em barris de madeira.
O destaque, claro, são as cervejas, que representam a própria personalidade do bar. Mas não menos importante, o cardápio de aperitivos conta com dadinhos de tapioca, batata rústica, e o mais famoso, o buraco quente — Pão francês recheado costela de boi desfiada, requeijão cremoso e coberto com mussarela gratinada.
O Brewteco funciona desde 1966, possuindo outras unidades nas Zonas Norte (Del Castilho e Tijuca); Sul (Gávea, Leblon, Morro da Urca e Botafogo) e Oeste (Barra). A unidade da Lapa é a primeira no Centro da cidade.
Celeste
O lindo empreendimento da família Lilia/Labuta ocupa um casarão centenário da Lapa e mantém uma estante de madeira que pertenceu à primeira loja Lidador, nos anos 1920. O chef Lucio Vieira se uniu ao DJ Nepal e ao bartender Frederico Vian, para criar a casa mais com a cara de Lapa do grupo — com direito a trilha musical e drinques espertos. No almoço, o menu de Lucio com a chef Ana Carbonell é marcado por massas frescas e artesanais, gostosuras como pappardelle ao pomodoro, com guanciale e pecorino. Já à noite, a casa é o território de aperitivos como a sardella com focaccia, radicchio, cenoura assada, couve-flor e páprica, e pratos com queijos e itens de charcutaria.
Nova Capela
Para não dizer que não falamos da tradição, ainda tem o Nova Capela, que fincou suas raízes na Lapa em 1903. Dos tempos em que sediou a famosa briga entre o compositor Geraldo Pereira e o malandro Madame Satã, o Capela já viveu bons e maus momentos — e quase fechou as portas. A novidade, neste caso, é não ter mudado. Salvo pelo gongo, ou melhor, por Antônio Rodrigues, dono do grupo Belmonte e famoso recuperador de casas no limbo da falência, continua com o famosérrimo cabrito aperitivo e um dos chopes mais bem tirados do planeta — ou pelo menos, da Lapa.