A 2ª Turma do Conselho Superior do Ministério Público do Rio rejeitou, na última quinta-feira (21), o arquivamento do inquérito civil instaurado há pouco mais de seis meses para apurar irregularidades na compra de 30 caveirões por mais de R$ 20 milhões. O contrato foi assinado pela Secretaria de Polícia Militar com a Combat Armor Defense do Brasil.
O detalhe é que o Ministério Público Federal (MPF) acaba de denunciar o ex-CEO da mesma Combat Armor Defense, Maurício Junot, o ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Silvinei Vasques, e mais seis pessoas, por fraude na compara de 15 caveirões pela PRF.
Já existe um acórdão do Tribunal de Contas do Estado (TCE) destacando graves irregularidades no contrato entre a PM e a empresa. Entre elas, a restrição de acesso público aos autos do processo administrativo; a inclusão de cláusula restritiva ao caráter competitivo do certame; o fato de os atestados não comprovarem a qualificação técnica da Combat Armor Defense para a execução do objeto; e também de a empresa estar inadimplente em contrato ainda vigente e decorrente da mesma ata de registro de preços.
Patrícia do Couto Villela, da 1ª Promotoria de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania da Capital, pediu o arquivamento argumentando, em síntese, que os blindados já haviam sido entregues. A promotora entendeu que a aplicação de multa pela Polícia Militar (por atraso na entrega dos caveirões) e o impedimento de licitar e contratar com o governo do estado — pelo prazo de quatro meses — seriam punições suficientes à empresa. Com relação à qualificação técnica da Combat Armor Defense, o Grupo de Apoio Técnico Especializado (Gate) informou que não há em seu corpo técnico profissional formação e expertise necessárias para analisar os atestados apresentados.
O procurador relator, Márcio Mothé Fernandes, discordou. No seu voto, destacou que o TCE entendeu que era necessário oficiar o Ministério Público Estadual acerca do resultado das apurações sobre o contrato, considerando “a extensão e a inequívoca gravidade dos achados de auditoria”. Lembrou que as mesmas irregularidades envolvendo a empresa estão sendo apuradas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), já que a Combat Armor Defense também foi contratada pela Polícia Rodoviária Federal.
Em seu acórdão, o TCU informou que a empresa foi aberta em 2011, no estado americano de Idaho, com o nome “Ad Faction, Inc.” — e tinha como atividade econômica principal a atuação no ramo de publicidade. Depois, permaneceu inativa entre 2013 e 2018. Em janeiro de 2019, protocolou pedido de reintegração, alterando o seu nome para “Combat Armor Defense, Inc.”. Dias depois, sua atividade econômica foi alterada para “viabilizar operações no Brasil”. Para o Tribunal de Contas da União, essa trajetória seria um indício de que se trataria de “empresa de papel”, que nunca teria atuado no ramo de blindados.
Mothé lembra, em seu voto, a importância do serviço que a empresa deve prestar à PM: blindagem.
“Diante disso, com o intuito de minimizar o risco de que eventuais falhas pudessem comprometer a segurança dos policiais, exigia-se um maior rigor e atenção por parte dos gestores públicos no que tange à capacidade técnica da empresa contratada”.
Márcio Mothé disse, então, que, “diante da gravidade dos fatos”, entendia ser necessário o prosseguimento do inquérito. Ele sugeriu que, em vez de pedir o arquivamento, a promotora deveria solicitar ao TCE o compartilhamento dos documentos que serão encaminhados pelo Tribunal de Contas da União sobre a Combat Armor Defense e os produtos que ela entrega.