Mesmo sem jamais ter pisado na Câmara do Rio, o rapper Oruam — ou melhor, o projeto de lei que acabou ficando conhecido pelo seu nome — provocou uma mudança significativa no velho Palácio Pedro Ernesto. Após a “manobra” que impediu o arquivamento da chamada Lei Anti-Oruam, a Casa precisou alterar o regimento interno para fechar a brecha que dividiu os vereadores na terça-feira (2).
Com a nova norma, publicada nesta quinta-feira (4), as abstenções passarão a ser contabilizadas como votos, e não apenas como presença. A mudança ocorreu depois de um bate-boca em plenário, quando o time de autores, liderado por Talita Galhardo (PSDB), mudou o voto de última hora ao perceber que a medida seria arquivada por falta do quórum mínimo de 26 votos.
Isso porque, segundo o regimento, apenas votos favoráveis e contrários eram considerados na contagem e, caso o quórum mínimo não fosse atingido, o texto ficava prejudicado. Dessa forma, os autores transformaram seus votos em abstenções para que o projeto voltasse à discussão na próxima sessão. Ao final, foram contabilizados 19 votos, sem contar as 10 abstenções.
Vereadores classificaram a ação como manobra
Embora legal, a estratégia foi considerada por alguns vereadores uma manobra e levou o presidente da Casa, Carlo Caiado (PSD), a anunciar a proposta de alteração do regimento. A mudança será debatida em sessão extraordinária na próxima terça-feira (9) para decidir a questão central: abstenção é ou não considerado voto?
“Será avaliada na próxima terça-feira essa alteração do parágrafo 2º do artigo 17 do regimento interno. Abstenções seriam computadas como voto nominal, permitindo que os vereadores votem nem sim nem não. Como se trata de um texto contra apologia ao crime organizado, muitos parlamentares têm demonstrado receio de votar a favor da lei”, afirmou Talita.
‘Precisamos avaliar isso para o futuro’
Por sua vez, o coautor Pedro Duarte (Novo) destacou a importância do projeto, mas também ressaltou a necessidade de rever a questão regimental.
“Este projeto é muito claro: impedir que dinheiro público financie shows que façam apologia ao crime. Não é contra o funk. Quanto à questão regimental, concordo que precisamos analisar isso para o futuro. Uma solução seria que a abstenção, mesmo não sendo computada como voto, conte para o quórum”, afirmou o parlamentar.
Projeto chegou a ser arquivado e depois ‘desarquivado’
Protocolado em fevereiro, o projeto busca proibir que a prefeitura contrate artistas que façam apologia ao crime organizado ou ao uso de drogas em apresentações abertas ao público infantojuvenil. Desde então, vem gerando intensos debates e sendo sucessivamente adiado.
A questão das abstenções já havia causado polêmica anteriormente. A Lei Anti-Oruam chegou a ser arquivada e depois “desarquivada” por um erro na contagem de votos. Na ocasião, os vereadores identificaram nas manobras para derrubar a medida as digitais de Márcio Ribeiro (PSD), líder do governo Eduardo Paes. Quem decidiu pela abstenção de última hora foi Salvino Oliveira (PSD).
Lei Anti-Oruam foi inspirada em projeto de São Paulo
Inspirada em um pacote de leis apresentado pela vereadora de São Paulo Amanda Vettorazzo (União), a versão carioca da Lei Anti-Oruam tem como objetivo garantir responsabilidade e respeito à proteção de crianças e adolescentes na realização de eventos.
O nome do projeto faz referência ao rapper Mauro Davi dos Santos Nepomuceno, conhecido como Oruam. Filho de Marcinho VP, um dos principais líderes da facção criminosa Comando Vermelho (CV), o cantor foi preso em julho e atualmente responde em liberdade a sete acusações, incluindo tráfico de drogas, ameaça e lesão corporal.


