ATUALIZAÇÃO 31/07 às 15h06 para inclusão do posicionamento da Prefeitura do Rio
A exposição a altas concentrações de poluição atmosférica nos bairros de Bangu, Paciência e Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio, pode contribuir com a morte de 8,5% das crianças de até cinco anos da região. É o que aponta estudo realizado pela Universidade Federal do Rio (UFRJ) e pela Universidade Veiga de Almeida (UVA), publicado este mês no periódico Bulletin of Environmental Contamination and Toxicology.
No trabalho, os pesquisadores avaliaram o nível do material particulado fino (MP2,5) — partículas com diâmetro igual ou inferior a 2,5 micrômetros, cerca de 50 vezes menor que a espessura de um fio de cabelo — em quatro pontos da Zona Oeste.
Entre esses pontos estão Bangu e Paciência, monitorados com equipamentos próprios e de baixo custo, além de duas estações do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), localizadas no Largo do Bodegão e na Escola Municipal Adalgisa Nery, ambas em Santa Cruz.
O que dizem os especialistas responsáveis pelo estudo
Segundo Cleyton Martins, professor do Mestrado Profissional em Ciências do Meio Ambiente da UVA e um dos autores do estudo, a exposição a MP2,5 em concentrações acima de 15 microgramas por metro cúbico (µg/m³) está diretamente associada à mortalidade infantil.
“As fontes emissoras incluem veículos, indústrias e queimadas. Isso reforça a necessidade de planos de gestão e monitoramento da qualidade do ar mais eficientes, especialmente para proteger populações vulneráveis”, destou Cleyton Martins.
Como os dados foram coletados
Os dados foram coletados por monitoramento contínuo entre abril e novembro de 2023, período caracterizado por baixa precipitação e piores condições de qualidade do ar. Durante esse intervalo, mais da metade dos dias registrou concentrações de MP2,5 acima do limite recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que é de 15 µg/m³ para garantir uma boa qualidade do ar.
O estudo cruzou esses dados com informações do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Prefeitura do Rio. Entre crianças de um a cinco anos, a taxa de mortalidade foi de 14,9 por mil nascidos vivos, com 28,2% das mortes atribuídas a doenças respiratórias e 5,3% a doenças cardiovasculares.
Resultado do estudo
Para chegar ao resultado, os pesquisadores utilizaram o software AIRQ+, desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde. Essa ferramenta estima o impacto do material particulado na saúde da população, comparando os níveis reais observados de poluição com um cenário ideal, que respeita as diretrizes de qualidade do ar da OMS.
A partir dessa análise, chegou-se à conclusão no estudo de que os níveis de poluição na região de Bangu, Paciência e Santa Cruz podem ter contribuído para aproximadamente 8,5% das mortes infantis entre crianças de até cinco anos.
O que diz a prefeitura
Em nota oficial, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Clima (SMAC) reforçou a importância do estudo desenvolvido pela UFRJ e pela UVA.
Segundo a prefeitura, as médias mensais de concentração de MP2,5 obtidas na pesquisa foram comparadas com os valores da diretriz da OMS para média anual (15 µg/m³) e com o padrão nacional estabelecido pela Resolução Conama 491/2018, que fixa o limite anual em 25 µg/m³.
“Apesar do número reduzido de meses, o período escolhido para comparação é particularmente relevante, pois corresponde ao inverno, estação mais seca, quando as características climáticas tornam os episódios de má qualidade do ar mais frequentes e intensos. Segundo o estudo, todas as médias diárias ficaram abaixo do padrão diário de qualidade do ar definido pela Resolução Conama e, portanto, a qualidade do ar foi classificada como boa no período analisado”, informou a secretaria.
Ainda de acordo com a SMAC, cerca de 30 monitores de baixo custo — sugeridos pelo artigo como uma alternativa para ampliar o acesso à informação — já foram instalados no Rio em parceria com o Google e com o programa Breathe Cities, da C40 e do CAF. Esses equipamentos se somam às oito estações de referência da SMAC, que operam há quase duas décadas.
“Com a ampliação recente do monitoramento e as novas parcerias, a SMAC e o COR pretendem desenvolver painéis de dados sobre a qualidade do ar, permitindo que a população tenha acesso mais fácil às informações e favorecendo a construção de políticas públicas baseadas em dados, específicas para melhorar a qualidade do ar em diferentes regiões da cidade”, destacou a pasta.
O governo municipal também ressaltou que a OMS e a comunidade acadêmica têm alertado continuamente sobre os riscos à saúde causados pela poluição do ar, principalmente para crianças e idosos. Mas a prefeitura frisou que o cenário da capital fluminense tem particularidades importantes.
“Nos grandes centros urbanos e regiões metropolitanas, onde há intensa atividade industrial e alto fluxo de veículos, o desafio é ainda maior. Esse é o caso do Rio, especialmente na Zona Oeste, que, além de enfrentar congestionamentos diários, abriga um parque industrial com unidades de produção de alto potencial poluidor, como siderúrgicas, além de sofrer com queimadas, cada vez mais frequentes e intensas em períodos secos”, explicou a SMAC.
A nota finaliza afirmando que a melhoria da qualidade do ar exige ações integradas dos três níveis de governo, com políticas voltadas para a redução das emissões do transporte, da indústria e das queimadas.
“No Brasil, os órgãos estaduais de meio ambiente são responsáveis pelo monitoramento da qualidade do ar e pelo licenciamento das indústrias de maior potencial poluidor, como o complexo siderúrgico da Zona Oeste. Ainda assim, a qualidade do ar no Rio de Janeiro tem sido uma preocupação permanente dos gestores municipais”, diz a nota.
E conclui:
“No que se refere às emissões veiculares, a Prefeitura tem trabalhado para melhorar o trânsito e otimizar o transporte público, com investimentos no BRT, no VLT e em estratégias menos poluentes, além de ações permanentes para reduzir os congestionamentos na cidade.”