O Salgueiro ou A Salgueiro? O Paraíso do Tuiuti ou A Tuiuti? Embora para quem já está acostumado a acompanhar as agremiações do carnaval carioca possa parecer algo tolo, não é tão difícil encontrar quem se enrole entre o feminino e o masculino, na hora de se referir às escolas de samba do Rio.
Cada uma possui sua orientação oficial. O Salgueiro, por exemplo, é no masculino por ter origem no Morro do Salgueiro. Como é o caso de muitas agremiações que também carregam o nome de seus territórios.
Contudo, segundo o professor e historiador Luiz Antônio Simas, a regra não é tão clara assim. Então que explica o caso da maioria das escolas que começam com “Unidos”, como Vila Isabel, Padre Miguel, ou Tijuca, serem tratadas, curiosamente, pelo artigo feminino?
“A maneira como as escolas se autorreferenciam não tem exatamente uma regra fundamentada na língua portuguesa”, explica o professor. “Cada escola encontrou, por alguma razão, a sua maneira. O Salgueiro, por exemplo, leva em consideração o Morro do Salgueiro, berço da escola”, diz.
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A realeza do samba
Para além do feminino ou masculino, os nomes das escolas de samba também ajudam a contar a história do carnaval. Se tratando de uma cultura “afrocarioca”, em um país que enfrenta o desafio do racismo, as agremiações buscaram alcançar legitimidade, também, através de nomes “pomposos”, que remontam a uma herança imperial. O historiador dá o exemplo das escolas Imperatriz e Império Serrano.
“O imaginário da monarquia é muito forte no Brasil. A república não conseguiu construir um imaginário tão forte do ponto de vista do campo simbólico dos afetos brasileiros como a monarquia construiu”, exemplifica.
Outra curiosidade são os nomes que buscam alcançar legitimidade através do campo do conhecimento. Acadêmicos do Salgueiro, segundo Simas, quase foi “Catedráticos do Salgueiro”. No entanto, o título, apesar de pomposo, não ornava bem nas letras de sambas.
Tradição oral do carnaval
O historiador destaca que a história do carnaval, em grande parte transmitida através da oralidade, segue em transformação. E relembra que escolas atualmente identificadas como A Beija-Flor ou A Viradouro nem sempre usaram o artigo feminino.
A mudança, no entanto, apesar de consolidada, não é registrada necessariamente em estatuto. Porém, uma vez consolidada entre quem importa — ou seja, a comunidade —, precisa ser respeitada.
“A cultura do samba é uma cultura baseada na oralidade. Tem seus códigos, tem suas sapiências. Então eu acho que a gente tem que respeitar como a escola quer ser tratada. Nesse sentido, O Salgueiro, A Portela, e estamos conversados”, conclui.